97. O medo e as fobias 1
04/08/2020
Todos nós podemos apresentar, em alguns momentos, episódios de medo, na ordem do racional, bem como episódios fóbicos, ou seja, temores absurdos e até mesmo irracionais. Claro que tudo ou quase tudo é uma interpretação da realidade externa, na qual nosso mundo interno produz os sintomas. Podemos, inclusive, temer a vida, mas em geral temos medo da morte. Entendemos por medo algum sentimento articulado com a ansiedade somatizada (palpitações, suores e tremores) ou psíquica (medo antecipado ao futuro, associado com bastante desconforto).
Costumamos a ter medo da finitude, do desconhecido, da dor e sofrimento. Medo até de vivências prazerosas de êxito, de dar certo na existência. O medo do passado costuma vitimar todos nós. Não queremos repetir questões desagradáveis que nos tiraram da zona de conforto. O medo do futuro é notável em vários contextos, pois não podemos contrapô-lo antecipadamente de maneira alguma. Outros medos comuns: incêndios, animais potencialmente perigosos, andar em lugares ermos e assim por diante. Medo de perder entes queridos e de desastres próximos também fazem parte dos nossos receios. Hoje em dia, a perspectiva de um assalto também é mobilizadora. Há muitos fatores estressantes na nossa vida moderna e civilizada.
Para o indivíduo normal, a memória e as experiências vão estabelecendo a visão de mundo e alguns temores em princípio verdadeiros.
O medo serve, antes de mais nada, para nossa defesa, assim como a febre. Presta-se a condutas legítimas de prevenção e cuidado. Sua articulação com algum contexto é fundamental para a vida no atual cotidiano.
Se uma pessoa sentir-se mal em um supermercado, em um cinema ou em um avião, poderá desenvolver certo medo relacionado a esses locais. Isso, inclusive, é mais comum do que se imagina. Até verdadeiras fobias podem articular-se a esses episódios. Isso já é um pouco mais difícil de ocorrer. Quando o indivíduo sofre um assalto, pode desenvolver estresse pós-traumático. Como se sabe, em situação de pânico, não precisa haver ocorrido nada. Parece algo que acontece no mundo interno dos humanos.
No transtorno de estresse pós-traumático surge uma resposta posterior ao trauma vivido com catástrofe iminente e angústia acentuada. Aqui, existem repetições mnêmicas, ou em sonhos, de coisas relacionadas aos traumas: um montante de energia que o ego não consegue administrar bem. É comum haver estado de hiperexcitação autonômica e de hipervigilância. O medo e a depressão em geral surgem de modo perturbador. Não é necessário lembrar que, em vários indivíduos, existe o uso de álcool ou drogas leves para minimizar os efeitos do transtorno traumático, pois até o corpo sofre com taquicardia, tremores e sudorese. O psiquismo sofre com muita ansiedade e, não raramente, sinais depressivos, como já dizemos em outro contexto. O fator desencadeante, o trauma, é importante para o diagnóstico psicológico, pois em neuroses obsessivas podem existir sintomas com causação etiológica diversa.
Se o agente estressor envolver mais pessoas, podemos estar observando um choque cultural (bombardeios) ou o terrível hospitalismo nas crianças. É lógico levar em conta a gravidade dos sintomas presentes e até a história e a personalidade prévia: tudo diante da situação verdadeiramente traumática. É importante lembrar que os medos são razoáveis e as fobias costumam ser absurdas.
Na próxima semana, abordarei “O medo e as fobias 2”.
Quero matar toda poesia.
Chega de ser tradutor de silêncios.
Transcrever acasos, sentimentos.
O tempo atravessa meu peito.
A memória: hoje, apenas nuvem.
Queria matar as palavras.
Escrevo para ficar sem elas.
Sonho e quase as tenho de volta.
Rimas, metáforas, já nada inventar.
Reaparecer nos sonhos.
Pego as poesias e jogo no chão de terra.
Apodrecem.
Jogo no ar, elas voam e perco
minha pretensa autonomia.
Criam asas e voam longe do chão.
Fazem voo próprio.
Atiro-as no fogo: cinzas.
Cinzas sem nenhum nome.
Atiro as poesias no meio da existência,
elas só parecem afogar.
Nomes submersos.
As palavras não alcançam a realidade.
Escapam sempre do mundo.
O papel nunca poderá voltar ao branco.
Foram sujos e assim continuam.
As ideias viajaram tanto
nesses brilhantes papeis inúteis.
Despir o mundo e despedir das palavras
é sempre um fracasso.
Uma estranha irresponsabilidade.
Ainda assim, escrevo.
(poema de minha autoria)
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