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28. As causas ou a etiologia dos transtornos mentais 5

10/12/2018​

Para finalizar nossas considerações sobre esses aspectos da etiologia das alterações psicopatológicas, devemos estender aos processos da recusa e da forclusão ou repúdio as etapas atribuídas por Freud ao recalcamento. Há uma primeira fase ou momento da clivagem psíquica nas neuroses, o chamado recalque originário ou primário que, como vimos, tem profunda relação com a fixação, sobredeterminada por elementos endógenos (hereditários e constitucionais) e exógenos (experiências traumáticas precoces).

Não devemos esquecer que tal fixação é relida através do après-coup, conforme já foi assinalado. Assim, correspondentemente a esse processo geral de recalcamento em sua fase primeira, podemos pensar também na forclusão ou repúdio primitivos ou originários, bem como recusa originária, em relações com fixações determinantes das psicoses e das perversões, respectivamente.

A clivagem produzida no primeiro momento dos processos de recusa e de repúdio cria um primeiro núcleo patógeno nas estruturas inconscientes e este acaba por funcionar como algo que exerce forte atração sobre os elementos a serem recusados ou forcluídos (repudiados). Se considerarmos ainda as analogias com o recalcamento originário, protagonista das neuroses, devemos refletir que também a recusa e o repúdio primários incidem nos representantes pulsionais e não diretamente na pulsão.

É importante considerar que o instinto, ao transformar-se em pulsão, possui duas representações: a afetiva e a ideativa.

Ainda tendo em vista as formulações freudianas sobre a teoria do recalque, podemos, por analogia, conceituar um repúdio ou rejeição propriamente ditos e também uma recusa propriamente dita, equivalente ao segundo momento ou fase do recalque. Esses processos, que operam posteriormente, funcionam de modo duplo: uma atração produzida no primeiro núcleo patógeno (fixação), somada a uma repulsa ou afastamento emanados das defesas egóicas. O terceiro momento, nessa linha de raciocínio, corresponde ao retorno do reprimido ou forcluído e ao retorno do recusado, sob a forma de sintomas psicóticos ou perversos.

Enquanto na sintomatologia psicótica a realidade é negada por meio das manifestações delirantes e alucinatórias, na sintomatologia perversa parte da realidade é aceita e, ao mesmo tempo, recusada, o que implica um conjunto de atuações referentes a esta parte, ambivalentemente aceita e recusada. Aceitar e não aceitar a castração na realidade.

É por meio do retorno desses conteúdos inconscientes recalcados, recusados ou repudiados que se pode atuar psicanaliticamente. Quando Lacan considera que cada sintoma neurótico é uma metáfora de um significante cujo significado sofreu recalcamento e que todo sintoma psicótico é uma metáfora de um significante cujo significado foi forcluído, permite considerarmos que todo sintoma perverso é uma metáfora de um significante cujo significado foi recusado. Isso, é claro, deve valer para outras tantas manifestações psicopatológicas.

Pensamos ser provável que as analogias aqui feitas no contexto da teoria do recalque, aplicadas aos processos de recusas e de repúdio, sejam válidas para as tentativas de explicação da especificidade das alterações psicopatológicas face à etiologia da "escolha" nas neuroses, perversões, psicoses e doenças psicossomáticas. Na medicina psicossomática observa-se, também, o encontro no indivíduo da genética e das experiências traumáticas associadas com a fragilidade orgânica do enfermo em questão.

Pode-se pensar também que cada sintoma psicossomático dentro da linguagem anterior, psicanalítica lacaniana, é uma metáfora de um significante cujo significado foi reprimido.

Sempre se trata de analogia entre os sintomas mais comuns nos transtornos psíquicos nos quais não se tem a tão desejada certeza.

Para mim é claro que tanto Freud como Lacan diferenciavam o recalque do reprimido. Utilizo o termo de repressão como sinônimo de recalque, pois assim aparece na tradução em português da Standard Edition pela Ed. Imago. No original, o termo "Verdrängung" é diferente do "Unterdrückung". O primeiro está ligado ao recalque ou recalcamento e o segundo, à repressão, que corresponde a um mecanismo para afastar da consciência uma ideia ou afeto desagradável, por meio de uma operação consciente. O recalque deve ser preferido ao uso do termo repressão, porque implica um processo geral vinculado à estrutura inconsciente. O termo repressão é utilizado com mais frequência, embora corresponda ao original "Underdrückung" e não ao "Verdrängung".

O leitor tem observado textos muito complexos no estudo das causas dos transtornos psíquicos. Deve aqui levar em conta que o recalque é bem mais inconsciente do que a repressão. Esta objetiva afastar do conhecimento momentâneo conteúdos psíquicos não compatíveis com algumas atitudes humanas. Isso, por meio do consciente, e os afetos reprimidos não recalcados produzirão os sintomas psicossomáticos de doenças até físicas ou orgânicas muito estudadas nos dias de hoje.​

Não se pode sonhar ou organizar tantos devaneios no psiquismo ao encontrar-se em uma linha de montagem. Também seria imprudente sonhar durante a realização de discussões econômicas em uma determina empresa. Assim, devem ser afastadas as fantasias, como observamos, próprias do mundo interno conscientemente para operações de risco. Todos esses procedimentos podem ocasionar transtornos psicossomáticos, diferentes em muitos aspectos das psiconeuroses: histerias, fobias e obsessões. As psiconeuroses são os exemplos mais estudados em articulação com o recalque.


Na próxima semana escreverei sobre a responsabilidade civil ou criminal dos indivíduos.

NÓS​

Todos nós somos vida.
Todos nós somos dúvidas.
Acaso e determinismo.
Metáforas do evolucionismo.
Somos soluções e problemas.
Tudo ocorre em nossos emblemas.
Mas, somos e não somos.
Auroras, crepúsculos,
esquálidos ou com músculos.
Todos nós somos vida.
É claro, muito claro ainda.


(Poesia de minha autoria).

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