24. As causas ou a etiologia dos transtornos mentais 1
12/11/2018
Meu interesse no momento objetiva estimular questões a respeito da causa dos transtornos mentais mais encontrados na clínica psiquiátrica. Muita coisa que acontece na vida obedece a uma certa causalidade múltipla, ou seja, vários determinantes precisam juntar-se na produção de um suceder psíquico normal ou anormal. É sobre isso que farei observações nessa narrativa.
Conforme iremos constatar, a evolução histórica dos transtornos mentais inicia-se na infância, talvez nos óvulos e espermatozoides com os aspectos hereditários envolvidos. Depois, ocorrem os traumas, as experiências negativas, os fatores externos, as fixações (já pensando psicanaliticamente) e então surge o indivíduo com determinado transtorno.
Minha linguagem é bastante metapsicológica, psicanalítica. Paciência, pois não consigo explicar certos comportamentos, até às vezes muito afastados da realidade objetiva, sem levar em conta o saber do inconsciente. Ao longo deste texto, descreverei os processos gerais articulados a esse saber que significa a criação dos principais distúrbios do comportamento.
Pretendo, também, enunciar que cada indivíduo, cada um de nós, apresenta vários "pequenos" transtornos psicóticos, neuróticos, psicossomáticos e perversos, que não chegam a caracterizar-se no âmbito de uma "verdadeira" doença mental. É claro que nosso mundo interno apresenta várias histórias não confessáveis. Mantemos dentro de nós fantasias estranhas, mas a civilização obriga-nos ao silêncio e, obviamente, às adequações necessárias para esconder comportamentos bizarros: definitivamente inconfessáveis.
Meu enfoque diz respeito à causa dos transtornos psíquicos, ou seja, a etiologia que os origina a partir da teoria psicanalítica e suas vicissitudes. Falarei de algum modo sobre o mundo interno e suas fantasias, bem como processos gerais que compõem a múltipla determinação para nosso psiquismo. Assim, deve-se considerar uma complexa articulação entre conceitos freudianos de fixação, série complementar e superdeterminação no enfoque da "escolha de neurose", que implica um conjunto de processos psíquicos envolvidos na formação de um tipo específico de neurose ou, como dissemos antes, na "escolha" de qualquer manifestação psicopatológica.
Quando Freud escreveu sobre a "escolha de neurose", estava referindo-se à possibilidade de um mesmo conflito intrapsíquico, conforme cada indivíduo, determinar estruturas neuróticas bem diferenciadas entre si. Afinal, cada pessoa expressará o conflito de um modo peculiar, determinado por certas características dependentes da fixação que, por sua vez, depende de uma complementariedade entre fatores predisponentes constitucionais, de um lado, e traumáticos psíquicos vivenciais, por outro lado.
É muito sutil o emprego que Freud faz do termo "escolha de neurose", pois se relaciona com o determinismo psíquico que opera uma espécie de "escolha" inconsciente: assim, o indivíduo participa de uma forma na maioria das vezes obscura e complexa nessa "escolha" inconsciente, que não é absolutamente aleatória, uma vez que implica a relação dialética entre elementos históricos (trauma psíquico) e constitucionais (predisposição). Em outras palavras, de modo sintético, a "escolha de neurose" mostra a indissolubilidade do conflito entre ser determinado e simultaneamente determinar de cada quadro nosográfico, em função dos elementos constitucionais complementados pelos históricos.
É no contexto das "Lições Introdutórias à Psicanálise" (1916-1917) que Freud enfatiza o conceito da série complementar, ao escrever que este implica que fatores exógenos (trauma psíquico) e endógenos (fixação) sejam complementares entre si. Assim, um indivíduo que apresente uma fixação forte necessita de um trauma psíquico mínimo para alcançar os objetivos configurados em sua "escolha de neurose". Também é correto dentro desse enfoque de complementariedade imaginarmos que uma pessoa que tenha uma discreta fixação necessite sofrer um ou vários traumas psíquicos em sua história pessoal para desenvolver determinada manifestação psicopatológica específica ligada aos objetivos de sua "escolha de neurose".
Agora, é preciso esclarecer um pouco mais o conceito de fixação do qual falamos anteriormente. Tanto no "Relato Autobiográfico de um Caso de Paranoia" (Schreber), como nos "Artigos Metapsicológicos", Freud aponta para esse conceito como ligado à origem do recalcamento, tratando-se aqui da primeira fase do recalque, também denominada de recalque primordial ou originário, capaz de preparar o indivíduo para os complicados processos gerais sobre os quais irão instalar-se certos mecanismos de defesa específicos (ligados ao caráter fixado), propiciadores do desenvolvimento neurótico, perverso, psicótico e tantos outros transtornos.
Sobre a natureza desses processos gerais, faremos mais tarde considerações pormenorizadas relativas às manifestações específicas da nosografia psicopatológica. Como estou enfocando o conceito de fixação, devemos, neste momento, perguntar sobre as condições em que esta se estabelece. Nesse sentido, é necessário levar-se em conta a história do indivíduo, com ênfase na época em que ocorrem os traumas psíquicos. Estes são determinados por uma gratificação ou frustração excessiva em alguns períodos do desenvolvimento da psicossexualidade, bem como através da alternância brusca entre a gratificação e a frustração num determinado período da história individual.
Outra importante condição para a fixação está relacionada com aspectos constitucionais do indivíduo, que implicam a força de determinado componente pulsional dependente de fatores genéticos desconhecidos e da influência da constelação familiar, como escreveu Freud: "Constituição neuropática familiar". Como resultado da fixação, temos as inibições do desenvolvimento libidinal em alguma fase da psicossexualidade, o que proporciona o retorno a esse ponto fixado, por meio do processo da pressão, quando, por algum motivo, a pessoa tenha forçosamente de retroceder, por não conseguir superar algum problema real ou mesmo imaginário em determinado momento de sua vida.
Na próxima semana continuarei esse assunto.
O PEDINTE
A mão estendida do mendigo
tiraniza a rua.
Desigualdade nua.
A tristeza aumenta nesse dia.
Cada verso transpira agonia.
O poeta balança entre auroras
e crepúsculos.
Sabe do silêncio
habitando espelhos.
Silêncio, flores?
Só abandono pobre,
em reflexos tristes.
Vazio e noite fria.
Angústia cresce dia a dia.
A mão estendida,
tiranizando a rua,
tristemente continua.
(Esta poesia é de minha autoria).
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