108. Os tiques
20/10/2020
São movimentos involuntários que, em geral, iniciam-se na infância, aos quatro ou cinco anos. Como foi narrado na gagueira, ou tartamudo, também não deveriam pertencer ao mundo infantil. São tristes episódios que suscitam maus-tratos de outras crianças.
Existem tiques vocais e motores. Aqui devemos afastar qualquer comprometimento neurológico. O emocional é subsequente ao biológico de maneira poderosa. Do lado motor, observam-se piscar dos olhos, mexer com os ombros e caretas faciais. No vocal, há expressão de algumas palavras e repetidas sílabas. A duração dos tiques em geral é limitada, felizmente. Porém, no transtorno de tiques vocais e motores múltiplos, com palavras e gestos obscenos, isso tudo pode pertencer a toda uma existência difícil. Titula-se Síndrome de Gilles de la Tourette. No geral, nestes casos, ocorrem vocalizações até explosivas e a queda é grave, dentro do chamado "normal".
É comum nesses transtornos haver ecopraxia (repetição involuntária ou a imitação dos movimentos de outras pessoas) associada com palavrões e gestos obscenos. A meu ver, elaboramos a partir de um inconsciente pleno de pulsão de morte e, portanto, como já foi narrado antes: muito explosivo e assustador.
É interessante observar que, durante o sono, todos os tiques, até os graves e inadequados, desaparecem e o cérebro encontra-se conservado. O lado emocional linguistico e motor só voltará depois, com os transtornos em vigília, e acredito que mais sujeitos ao mundo interno, pressionado pelas repressões, que objetivam adaptabilidade.
A literatura e a história falam de muitas freiras que episodicamente apresentavam tiques associados com gestos obscenos. É possível que juntos, como uma epidemia não biológica, pudessem expressar o proibido e negado nesse mundo de anjos e deuses. Uma espécie de inconsciente coletivo, originado a partir das absolutas negativas sociais. É oportuno lembrar-se que todos essas freiras não podiam abandonar o convento.
É muito importante observar, ainda, que os indivíduos acometidos pelos transtornos também apresentam certa ambivalência. Chamam atenção dos próximos de modo evidente e parecem sofrer de maneira involuntária todas as consequência que devem haver sobre essas infelizes vitimas, de uma realidade dura, forte e regrada.
É para quem leva em conta o saber metapsicológico, equivalentes linguísticos e motores que habitam o mundo interno e criam assim esses atormentados, essas pessoas muito tristes que sofrem e espalham o sofrimento. Muitas vezes, essas pessoas mostram-se deprimidas, pois não gostariam, ao menos em parte, de padecer desses inadequados comportamentos, presenciados na família, na escola e nas interações sociais. Felizmente, os tiques não costumam ser crônicos, se os próximos os aceitarem com menos críticas. Duram menos se os envolvidos não sofrem situações humilhantes.
Na próxima semana minha narrativa será sobre a gagueira.
NORDESTINO
Muito nordestino desceu,
com tristeza, muita saudade,
erguendo prédios,
fazendo a cidade.
Muito nordestino
criou a vida e a cultura,
sob desatino do sol a pino
que nunca esqueceu.
Sempre muito explorado
em seu destino.
Pobre destino,
o destino do pobre,
do nordestino.
Carlos Roberto Aricó
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