1. Palavras Iniciais
04/06/2018
Bem-vindo ao meu blog. Sou Carlos Roberto Aricó, psiquiatra e psicanalista. Ao longo de meio século de trabalho constante, escrevi livros sobre filosofia, ética, psicanálise, teoria do conhecimento, poesia e psiquiatria. Durante esse período, venho trabalhando junto aos seres humanos buscando explicitar os psiquismos envolvidos em seus comportamentos. Fiz conferências e ministrei muitas aulas dentro e fora do país.
Agora, julguei o momento certo de inaugurar esse espaço de reflexão, compartilhando esse conhecimento como um testamento e uma herança. Objetivo sempre a compreensão mais profunda do psiquismo, no qual associações de palavras em suas motivações básicas, muitas vezes inconscientes, permitem certa narrativa textual e também poética para cada um de nós. Procuro, sempre que possível, a articulação do inconsciente com suas causas e consequências no contexto do indivíduo associado ao poder e a psicanalise. Meu ponto de partida é o inconsciente de cada ser, manifestando-se em fantasias, sintomas ou sonhos que mobilizam e determinam as diferentes e repetitivas histórias do homem em equilíbrio ou em seus transtornos. Tanto e tudo construído pela fantástica e complexa linguagem. Falo aqui sobre meu proceder, sobre minha clínica, sobre o humano bem diverso do biológico, bem diverso da natureza.
Por hora, não responderei perguntas, pois desejo escrever do modo mais livre possível. Depois de algum tempo, é óbvio que as questões e outros comentários serão levados em conta com a seriedade de sempre.
Meus mais sinceros agradecimentos à Marina Aricó e Denise Eid pela valiosa colaboração. Meu agradecimento especial à Paulo Caruso que fez essa minha caricatura.
Ao longo de muitas semanas, vocês poderão verificar que existem duas narrativas: uma de psicanálise e psiquiatria, resultante da observação de cada ser humano; e outra poética, expressando afetos, dor, dificuldades, problemas com o tempo.
Tendo em vista as dimensões dos artigos sobre o psiquismo e também a extensão das poesias, as publicações poderão ser feitas em partes e serão enunciadas quando necessário. Haverá repetições de textos e também significações. Na maioria das vezes isso será assinalado. Espero a paciência do leitor.
As poesias expressas aqui, em geral, não possuem nenhuma significação óbvia com os textos relacionados ao psiquismo. São todas praticamente inéditas, apenas poucas já impressas em outros livros.
Sobre os textos de outros autores, estão assinalados e conservei a ortografia original, ou seja, aquela que o autor ou seu tradutor escreveram. Assim foi respeitada a forma de escrever no âmbito das edições propostas.
Com essa comunicação semanal, às segundas-feiras, pretendo desenvolver e estimular reflexões acerca do psiquismo. Meu objetivo é o de enunciar as diferenças entre o saber psiquiátrico e o psicanalítico, no contexto fundamental de que ninguém deve apropriar-se do saber relacionado a qualquer coisa.
Com muita determinação para novas reflexões, sei que várias coisas não mudam e provavelmente não mudarão. Independentemente da nossa vontade, muita coisa continua igual. O que pode ser mudado? Às vezes, parte do mundo interior, nosso estranho psiquismo, ao menos parte da vida emocional onde gravitam nossas poesias, realizadas ou não.
Várias narrativas poéticas que faço parecem obedecer a uma misteriosa ordem. Os pensamentos e certa lógica organizam a si mesmos, e assim vão se criando vocábulos pertinentes em uma sucessão poética. Não sou eu, o eu consciente e cognitivo. Reconheço que não sou eu e, sim, algo íntimo de mim, meu mundo interno. Fico espantado ao observar, acredito, um bom resultado, e talvez alguns versos coerentes e belos. Uma parte minha profunda expressa-se em conteúdo e forma que desconhecia até então. Algo bom acontece e, estranho ao meu psiquismo, ilumina-se. Surgem palavras bem utilizadas que provavelmente acontecem em uma parte recôndita minha. Que provoca em mim admiração e, ao mesmo tempo, dúvida.
Sei que a reflexão é o ponto de onde partem novas e velhas possibilidades. Deve-se apontar até, inclusive, para o conservadorismo dos monumentos sempre articulados a história. Nem sempre os verdadeiros mártires são homenageados pela memória associada às armas e às guerras.
Não refletir pode significar portos sem navios, portos sem viagem, sem navegação, sem os navegadores: aqueles que fabricam os sonhos, na dolorosa solidão do passado e das águas do paradoxal cotidiano.
Os heróis, os poetas, as crianças principalmente as excepcionais, os bêbados, os gênios, os deficientes mentais, os santos e os loucos - em seus delírios e alucinações verdadeiramente surrealistas - possuem algo próprio dos deuses. Só certa desrazão pode interpretar alguma luz peculiar a tantos sonhos. Luz quase sempre escondida no labirinto de qualquer um deles. Luz que foge da razão própria do cogito. Luz que não cabe no continuísmo e está bem longe do novo. Conservadorismo faz a história do sempre. Não podemos mais ser somente atores, representantes do nada.
Cada um poderá facilmente entender que esses textos estruturam-se como um canto das contradições e das ondas livres, as quais darão origem a associações de palavras, também livres. Escritas de desrazão, para seguir conversando, pretendem enfocar o verdadeiro oceano que habita o homem.
Transparências, sonhos de razão e lógica cruzarão meu caminho. Percorrerei lugares incertos e, com a possível atenção, pretendo enunciar as inúmeras dúvidas que emergem do cântico dos destinos. Sabemos pouco daquilo que está aí. É claro que algum conhecimento irei trazer para as reflexões do leitor. Espero mesmo que sim.
Nessa minha espécie de pedagogia do não saber, somente responderei, se possível, as questões eventualmente formuladas mais tarde, após minhas reflexões. Cada uma em sua noite e em seu tempo. Noite interminável? Penso que não. Isso foi comunicado na apresentação desse blog.
Durante esses meus textos e nossos encontros, haverá palavras e frases para alguma reflexão sobre psiquismo, como já foi dito, e alguma poesia, já que o autor se considera poeta. Assim posso expressar meu sentimento, minha forma de ver o mundo externo e, se possível, interno, onde minhas angústias e meu inconsciente gravitam às vezes até magicamente. Posso expressar o meu modo de ser ao longo de décadas nas quais lutei por transparência e honestidade. Os equívocos e incertezas sempre estiveram na minha essência, é bom lembrar-se disso: tanto nas poesias como nos textos reflexivos. Um saber psíquico e um não saber psíquico certamente vão originar minhas palavras. Minhas eternas dúvidas.
Não influenciaremos os aspectos emocionais do ser humano por intermédio da religião, e nem a cientificidade médica ou psicológica pode fornecer as respostas absolutas. Como se sabe, tanto a psiquiatria como a psicanálise estão mescladas ao relativismo e dúvidas, e o "saber" historicamente foi desenvolvido nas estruturas de dominação. Inclusive o que ensinar, e como fazê-lo, obedece a critérios muitas vezes obscuros e nos quais a maioria das pessoas só pode aprender enquanto alguns poucos ensinam, é claro, aquilo que podem e devem para as coisas continuarem como estão.
Na próxima segunda-feira, publicarei acerca do poder vinculado com as estruturas de dominação.
EU
sou sujo e puro
louco lúcido
também estúpido
ateu ou místico
dialética é meu dístico
coerente e contraditório
do silêncio ao falatório
sou poeta, cientista
animal e gente...
e na corda rota dos limites
o eterno equilibrista
com arte de ser artista
sou vivo, reto, morto,
direito e às vezes torto
pleno de dogma e dúvida
sou a força onipotente
e antiforça inválida
em minha colorida
existência pálida
Poesia publicada no livro "Tempo contra tempo", de minha autoria.
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